segunda-feira, janeiro 05, 2004

FILHOS DA LUA

A poucos graus abaixo da Linha do Equador, numa região do planeta extremamente quente, onde o sol brilha com extrema intensidade, um grupo de pessoas sobrevive a todas as adversidade impostas pela mãe natureza. Talvez a Ilha de Lençóis não fosse o local mais apropriado para eles nascerem, mas o destino pareceu traçar e colocar todas as adversidades possíveis na frente dessas pessoas. Como já disse Nieztsche: "Tudo o que não me mata, só me fortalece". E eles são assim, risonhos, intensos e cheios de historias. O fato eh que eles são albinos e o sol não perdoa a pele desses pescadores que precisam ficar expostos por horas a fio em busca de peixes para o seu sustento.

Na década de 80 eles eram dezenas, hoje sobraram apenas alguns para contar historias. O câncer de pele não perdoa e a taxa de mortalidade entre os albinos da ilha eh altíssima. Outros, com a chegada das linhas regulares de barcos, fugiram para o continente em busca de melhores condições de vida.

O que explica essa alta incidência de albinismo eh o isolamento que permaneceu a região ate meados da década de 90, o que propiciou diversos casamentos consangüíneos.

O apelido de Filhos da Lua surgiu pelo fato dos albinos da ilha preferirem as noites de lua para caminhar pelo vilarejo, uma trégua para as peles calejadas pelo sol. E os cabelos loiros e brancos se assemelham muito com a fisionomia dos primeiros jesuítas que falavam um português diferenciado e contavam historias de reis que desapareceram nas dunas, durante sanguinárias batalhas.
Assim os pescadores acharam que os Filhos da Lua fossem, desde a chegada dos primeiros portugueses na região, os descendentes diretos desse tal rei, que no imaginário local deveria ser um tanto quanto diferente.

Lembro-me que numa conversa interessante e instigante com Dona Luzia, uma Filha da Lua e parente de Dom Sebastião, como ela mesmo se designa, ele me perguntou se poderia lhe dar um presente. Achei que fosse pedir dinheiro e ela logo se adiantou:

"Você tem algum creme ou protetor para a pele. Eh que eu tenho uma criança pequena albina e não queria que a pele dela ficasse cheia de feridas como a minha."

Logo me agilizei e fui buscar na minha mochila o único protetor solar que tinha e um pós sol. O restante da viagem, sem proteção para a pele, pude sentir o ardor dos raios solares e imaginar a difícil vida daquelas pessoas. Enquanto minha pele ardia e descascava sentia-me feliz por saber que alguém estava fazendo um bom proveito com aqueles presentes...